Apesar do apoio mobilizado para a Ucrânia devido à invasão russa, a Comissão Europeia garante que a União Europeia (UE) “não negligencia” crises humanitárias noutras partes do mundo, prevendo alocar 800 milhões de euros para África este ano.
“As necessidades humanitárias estão a disparar em todo o mundo, (…) mas apesar de toda a atenção dada às necessidades humanitárias dos ucranianos, causadas pela agressão ilegal da Rússia à Ucrânia, a UE não está a negligenciar as crises humanitárias noutros locais”, afirma em entrevista escrita à agência Lusa o comissário europeu para a Gestão de Crises, Janez Lenarčič.
Dias depois de ter visitado a região da América Latina, onde inaugurou a primeira reserva de ajuda humanitária regional suportada pelo bloco comunitário, Janez Lenarčič afirma à Lusa que, nesta visita, foi possível “demonstrar uma vez mais que a UE não esqueceu o resto do mundo” e que continua “a estar presente na América Latina, tal como em África, Médio Oriente e Ásia”.
Dados referidos pelo responsável europeu indicam que, este ano, o executivo comunitário irá mobilizar mais de 800 milhões de euros em ajuda humanitária para toda a África, dos quais quase 500 milhões de euros se destinam à África Oriental e Austral e à região dos Grandes Lagos e quase 310 milhões de euros à África Ocidental e Central.
Janez Lenarčič elenca à Lusa que em causa estão “projectos humanitários em vários países que enfrentam uma multiplicidade de crises frequentemente simultâneas, como secas e outros riscos naturais, insegurança alimentar, desnutrição infantil, crianças que perdem a sua educação devido a conflitos e deslocações”.
Por exemplo, em locais como Moçambique, com conflitos e deslocações nas províncias de Cabo Delgado, a República Democrática do Congo pelos conflitos, insegurança alimentar, desnutrição e frequentes surtos de doenças e ainda no Mali e nos países da Bacia do Lago Chade, que enfrentam uma crise complexa motivada por conflitos e insegurança.
“As intervenções de ajuda humanitária visam, antes de mais, salvar vidas e assegurar meios de subsistência”, pelo que “trabalhamos com os nossos parceiros humanitários para fornecer alimentos e artigos não alimentares aos mais vulneráveis, ajudar as crianças a permanecer ou a regressar à escola, lutar contra a violência baseada no género e prepararmo-nos para catástrofes”, refere Janez Lenarčič.
A posição comunitária surge numa altura de confronto armado na Ucrânia devido à invasão russa, iniciada em Fevereiro passado, tensões geopolíticas que estão a afectar cadeias de abastecimento, causando receios de ruptura de ‘stocks’ e de crise alimentar, principalmente em África.
Questionado pela Lusa sobre um possível aprofundamento dessas carências alimentares e nutricionais no continente africano devido ao impacto do conflito na Ucrânia, Janez Lenarčič admite que “as pessoas em África já estão a sentir as implicações da guerra”.
“Os fundos recentemente atribuídos ajudarão aqueles que se encontram em situações terríveis a satisfazer as suas necessidades alimentares de emergência e a UE continua empenhada em apoiar os mais vulneráveis, mas a ajuda humanitária não pode substituir os esforços necessários para aumentar a resiliência das populações mais vulneráveis”, argumenta o responsável.
Tanto a Ucrânia como a Rússia são importantes fornecedores dos mercados mundiais, especialmente de cereais e óleos vegetais, como trigo, cevada e milho, pelo que Bruxelas reconhece o impacto imediato relacionado com o aumento dos custos ao longo de toda a cadeia de abastecimento alimentar, pela ruptura dos fluxos comerciais de e para a Ucrânia e Rússia, bem como as consequências na segurança alimentar global.
O norte de África importa mais de 50% das suas necessidades de cereais da Ucrânia e da Rússia.
Em Junho passado, a Comissão Europeia lançou uma plataforma para ligar empresas e activar corredores solidários para facilitar as exportações de alimentos a partir da Ucrânia.
Nesta visita à América Latina, Janez Lenarčič anunciou um montante de 153 milhões de euros de ajuda humanitária para a região, tendo ainda inaugurado no Panamá a primeira reserva de ajuda humanitária regional financiada pela UE com uma reserva de equipamentos para serem mobilizados em situações como catástrofes naturais.
De: Francisco Jovo